O Papa Francisco elogiou ontem os jornalistas que chamam de “injustiça à injustiça” e que realizam um jornalismo de “pessoas para pessoas”. Fê-lo durante uma audiência com um grupo de uma escola alemã de jornalismo. Obrigado, Papa Francisco. A luta é difícil mas, também é verdade, só é derrotado quem deixa de lutar. E é por isso que a nossa luta continua…
Por Orlando Castro
Ao receber os estudantes, professores e líderes deste centro com mais de 50 anos de história, Francisco agradeceu-lhes porque “como jornalistas se dedicam às pessoas e chamam injustiças às injustiças”.
“Obrigado por falarem sobre as coisas bonitas que podem não ser manchetes, mas que colocam as pessoas no centro, obrigado porque com o seu estilo cristão elas continuam a fazer um jornalismo de pessoas para as pessoas”, disse Francisco.
O Papa explicou que às vezes, “por hábito”, “permitimos que as coisas saiam à medida que vão ou como alguns decidiram que deveriam ir”.
“Vamos pular o muro de tristeza e resignação e ajudar as pessoas a abrirem seus olhos e ouvidos, mas acima de tudo, seus corações para serem guardiões uns dos outros e assim perceberem que são filhos e filhas do único Pai”, aconselhou.
E é exactamente no sentido do Jornalismo (não da propagada feita pela mão de supostos jornalistas) que o Folha 8 chama “injustiça à injustiça”, dá voz a quem a não tem, trabalha para os milhões de angolanos que têm pouco, ou nada, e não para os poucos que têm milhões.
Contrariamente à tese de quem manda na ERCA (o MPLA) e de quem dirige o Ministério da Comunicação Social, nós temos a em a obrigação e o dever de relatar os factos com rigor e exactidão e interpretá-los com honestidade.
Se, por acaso, não procuramos saber o que se passa não estamos a cumprir a nossa missão. Se sabemos o que se passa e, eventualmente, nos calamos, cometemos um crime junto das únicas pessoas a quem devemos prestar contas: os leitores.
É por isso que, a contrário da tese de quem manda na ERCA (o MPLA) e de quem dirige o Ministério da Comunicação Social, combatemos a censura e não aceitamos restrições ao acesso às fontes de informação, nomeadamente às de origem pública, e consideramos essas restrições uma inaceitável barreira à liberdade de expressão e ao direito de informar.
Usamos como critério fundamental a identificação das fontes. No entanto, não revelamos, mesmo em juízo, as nossas fontes confidenciais de informação, nem desrespeitamos os compromissos com elas assumidos. A não revelação das fontes é, aliás, uma das razões pelas quais vale a pena ser preso.
Salvaguardamos a presunção de inocência dos arguidos até a sentença transitar em julgado e rejeitamos o tratamento discriminatório das pessoas em função da cor, raça, credos, nacionalidade, sexo, filiação partidária etc..
Respeitamos a privacidade dos cidadãos, excepto quando estiver em causa o interesse público ou a conduta do indivíduo contradiga, manifestamente, valores e princípios que publicamente defende.
Gay Talese (esse perigoso inimigo do regime angolano) no livro “The Kingdom and the Power” (“O Reino e o Poder”), publicado em 1971, diz que “o papel da imprensa, numa democracia, é atravessar a fachada dos factos”.
Na verdade, não existe nas linhas de montagem de textos de linha branca (tão do agrado de quem manda na ERCA e no Ministério da propaganda) nenhuma autonomia editorial e, ou, independência. E não existe sobretudo, mas não só, por culpa dos jornalistas que, sob a conveniente (sinónimo de bem remunerada) capa da cobardia se deixa(ra)m transformar em autómatos ao serviço dos mais diferentes protagonistas, sobretudo dos ligados ao MPLA, partido no poder há – faz amanhã – 43 anos.
Habituados a viver na selva supostamente civilizada onde, com o patrocínio e cobertura dos poderes instituídos, vale tudo, os chefes de posto dessas linhas de produção entendem que a razão da força, dada por alguns milhares de kwanzas, dólares ou euros de avenças ou similares, é a única lei. Dos Jornalistas esperar-se-ia que lutassem pela força da razão. Não acontece. Não é de agora, mas agora tem mais força e seguidores.
Força da razão? Claro que não. Até porque em Angola, por exemplo, não existem Jornalistas a tempo inteiro. Na maior parte do tempo útil são cidadãos como quaisquer outros e que, por isso, não precisam de ser sérios nem de o parecer. Nas horas de expediente, sete ou oito por dia, exercem o comércio jornalístico, tal como poderiam exercer o enchimento de latas de salsichas.
Mas como existe uma substancial diferença entre exercer jornalismo e ser Jornalista, entre ser operário de um órgão de comunicação social (sobretudo estatal) e ser Jornalista, tal como exercer medicina e ser médico, continuamos a dizer que nesta profissão quem não vive para servir não serve para viver.
E é por isso que uma bitacaia no presidente do MPLA terá com certeza muito maior cobertura (ou até mesmo um livro sobre as Notícias do Palácio) do que o facto de Angola ter 20 milhões de pobres, ou de os angolanos serem gerados com fome, nasceram com fome e morrem pouco depois com… fome.
É por isso que os operários dos órgãos de comunicação, tal como quer quem manda na ERCA, lá estão para se servir, para servir os seus capatazes, e não para servir o público, para dar voz a quem a não tem.
Infelizmente os media estão cada vez mais superlotados de gente que apenas vive para se servir, utilizando para isso todos os estratagemas possíveis: jornalista/assessor, assessor/jornalista, jornalista/cidadão, cidadão/jornalista, jornalista/político, político/jornalista, jornalista/lacaio, lacaio/jornalista e por aí fora.
Como diz Gay Talese, cabe ao jornalista procurar incessantemente a verdade e não se deixar pressionar pelo poder público ou por quem quer que seja. Não interessa se as opiniões são do Secretário-Geral da ONU, da Rainha de Inglaterra ou do “dono” de Angola, de seu nome João Lourenço.
Falar hoje da regra basilar do regime angolano (até prova em contrário todos somos… culpados) é algo que desagrada aos poderes políticos de Angola, os mesmos desde 11 de Novembro de 1975.
Em Angola, 43 anos depois, uma muito grande parte da comunicação social amplia a voz dos donos do poder, na circunstância o MPLA, esquecendo que a sua função básica é dar voz a quem a não tem, neste caso aos milhões que – pior do que no tempo colonial, continuam a receber “desdém, fuba podre, peixe podre, panos ruins, cinquenta angolares e porrada se refilarem”.
o imperativo maior de um jornal é ir ainda para além da verdade